quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Sobre o tempo

Postado por Infinito Particular às 06:13 3 comentários

O tempo, como todos sabem, é relativo. E tem gente querendo mexer na relatividade. Mais precisamente, tem gente sugerindo mudar o calendário para unificar coisas como taxas de juros. Sabem o que eu acho? Perda de tempo - literalmente.

Explico o que acontece: um grupo de pesquisadores da Universidade de Johns Hopkins, nos Estados Unidos, tem defendido a adoção mundial de uma folhinha planejada. As informações são de uma matéria sobre o assunto, que foi publicada ontem no Jornal Estado de Minas. A reportagem explica que de acordo com esse calendário, todas as datas iam cair sempre no mesmo dia. O dia 7 de janeiro, por exemplo, seria sempre um sábado. Imaginem agora o desastre que seria fazer aniversário sempre na segunda-feira.

Ao longo da história já existiram vários calendários e não acho que uma mudança na contagem de tempo seja um problema. Mas vamos combinar que a gente já faz cálculo demais nessa vida para escolher nosso calendário baseado no funcionamento de um sistema financeiro que - olhem só! - nem funciona. 

Não estou desvalorizando o trabalho do economista Johns Hopkins e do astrofísico Richard Conn Henry, idealizadores do projeto. Cada um tem uma referência. Só não acho que um referência econômica seja suficientemente superior à todas as outras, de forma que mereça ser a base para o nosso tempo - que é cada vez menos bem aproveitado e confuso justamente em função do nosso comportamento na área econômica. 

No caso acho que outras pessoas poderiam se sentir no direito de propor uma nova contagem. Hippies, poetas, ateus, angolanos, crianças, baladeiros, agricultores, esportistas - cada um pela sua referência. Por que não?

Já acho ousadia demais a gente ficar contando o tempo. Uma ousadia necessária, claro. Mas todo mundo concorda que as horas se arrastam quando estamos fazendo uma coisa chata. Concorda que hoje o tempo voa, amor. E escorre pelas mãos. Não adianta: ele é rebelde, ele não é nosso. Ele passa. 

Vamos parar com essa bobagem de ficar mexendo na relatividade como se o tempo fosse um relógio. Não é: o relógio foi mais uma tentativa capenga de dominar o tempo, a de mais sucesso entre todas que, inevitavelmente, sempre tem um pouco de fracasso. Porque o tempo é um mano velho. E o máximo que a gente pode fazer é deixa-lo correr macio. E viver tudo o que há para viver. E nos permitir. 

Postado por: Marcela

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Pedra no sapato

Postado por Infinito Particular às 13:23 0 comentários
Acredito que consumada a evolução humana, ainda teremos um mundo de afazeres e de coisas importantes para discutirmos. Alguns acham que uma total solução de problemas tão gritantes que vivemos hoje em dia nos levaria a uma era enfadonha e vazia, sem desafios. Discordo: depois da curva do básico, há ainda muita coisa que pode nos motivar a viver neste mundo.

Mas antes é preciso que o básico do básico seja estabelecido. É preciso que reformemos totalmente esse século e encaremos nossos problemas do começo. Do comecinho. E para isso vai ser preciso também que a gente comece a abrir mão de algumas coisas, principalmente de velhos confortos que a gente acha que são bons.

Gosto de promover pequenas mudanças na minha casa me baseando no feng shui, e um dia irei promover uma reforma total de acordo com a filosofia chinesa. O feng shui acredita que as energias que circulam na nossa casa podem trazer boas ou más energias para a gente, por isso é preciso harmonizar o ambiente no que você vive, e que é o lugar mais seu nesse planeta. Vou explicar rapidinho algumas coisas, só para dar pra entender. É como se, por exemplo, os encanamentos fossem as veias da casa. Um vazamento pode, então, significar emoções descontroladas, enquanto um entupimento pode significar emoções reprimidas. Tem também o jogo de cores. Laranja deixa o ambiente alegre, o azul traz tranquilidade. É bom ter azul nos quartos, da mesma forma que é aconselhável tirar a cama da direção da porta, para trazer mais calma. E outras tantas coisas. Coisa demais.

Não seria coisa demais se a gente não vivesse num contraste gritante, um contraste triste que nos impede de ficar pensando em feng shui ou no cinema francês com a profundidade e interesse que esses e outros temas mereciam.  É tanta tragédia, que dá culpa desviar os olhos disso. Dá um remorsozinho olhar para as coisas boas, e isso só pode estar errado. Porque eu acho que seria mais fácil olhar de vez para o problema, encará-lo, enxergar os detalhes e procurar a solução. Aqui vale a velha regrinha: se ponha no lugar do outro.

Se imagine, um único instante, sem casa.

Todo feng shui, todo estudo de decoração, toda inovação em eletrodomésticos, toda coleção de orquídea vai por água abaixo quando a gente pensa que temgente sem casa. Todo janeiro chove, e toda chuva traz notícias de desabamentos e enchentes. Pode parecer que esse ano tem sido pior, mas no ano passado teve o desastre em Angra e Petrópolis - então quando é que isso vai parar? Não acredito que exista alguém que não sofra vendo essa situação. Acontece que a gente também tem outros afazeres, e às vezes acaba usando do recurso do esquecimento para não parecer mais um sensacionalista apontando com todos os dedos os problemas que vem com a chuva.

Mas é que às vezes eu acho muito difícil continuar. É claro que não vou ficar falando aqui todos os dias dos problemas do mundo, porque sou uma otimista incorrigível que realmente acha que é preciso falar das coisas boas. Mas a verdade é que está doendo muito isso tudo, doendo em mim, doendo em todos os janeiros da nossa década. É como quando a gente está andando com uma pedrinha no sapato, e como ainda não feriu nossa própria pele, a gente continua. A gente continua, mas não pode correr, saltitar, porque aquilo ali está incomodando. Então você vai ter um caminhar muito limitado até resolver parar e fazer um esforço para tirar aquela pedra do sapato.

Não vamos parar de andar para frente. Não vou parar com meu feng shui. Vamos seguindo, claro. Mas a gente tem uma pedra no sapato, e uma hora vamos ter que parar e tentar tirar. Vamos começar do começo, vamos tentar uma solução, vamos lembrar todos os meses de que precisamos de uma solução, definitiva. Porque tem gente sem casa. E não é bem a chuva que tem culpa disso.
 

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