domingo, 20 de fevereiro de 2011

Meu tipo inesquecível

Postado por Infinito Particular às 17:36 2 comentários
Meu tipo inesquecível entrou pela cozinha eufórica, sem saber como dar a notícia aos meus tataravós. Eu ainda não existia. Porém, de certa forma eu nascia ali, em um destes instantes absolutamente casuais da vida. Vó Elisa, que ainda era só Lisa, surgia diante dos meus olhos à medida que minha tia contava tudo o que sabia da história da família. Eu também estava numa cozinha, cerca de cem anos depois da narrativa que agora me levava à minha bisavó, meu amor desconhecido, meu tipo inesquecível.


A notícia que Vó Elisa tinha para contar é que ia se casar, por amor, carinho, tradição e tudo mais que leva duas pessoas a se unirem. O tipo irresistível da minha bisavó era um homem trinta anos mais velho que ela, que tinha perdido a esposa e os oito filhos por causa de uma peste, e que teimava em viver mesmo assim. Gosto de acreditar que foi a teimosia dele que encantou minha bisavó, que também teimava em levar a vida, e até – olhe só! – ser feliz. Bisavô Artur e Bisavó Elisa se casaram. Alguns anos e três filhos depois, ele faleceu.

Na história que conduz até a minha existência há muito mais do que pareço merecer. Minha bisavó Elisa foi expulsa de sua pequena terra assim que meu bisavô se foi, e buscou abrigo em uma fazenda onde trabalhava de sol a sol. Depois de quase sofrer um abuso sexual, acabou indo morar na casa dos donos da fazenda, ensinando as filhas do casal a ler, coisa que aprendeu sozinha, e por teimosia, e que amava mais do que tudo. A história da minha bisavó continua ainda por muitos capítulos, que incluem buscas, ideias revolucionárias, um enorme número de netos. Porém foi bem aqui que ela se tornou meu tipo inesquecível. Com um livro nas mãos, os pés no chão e o coração vibrado, Vó Elisa entra para sempre dentro de mim como o pedaço de história que justifica meu próprio eu e a dívida de gratidão que tenho com as palavras – e que tanto amo pagar.


Inspirado nos textos de Luís Nassif, que teve a idéia de dissertar sobre seus tipos inesquecíveis.
Postado por: Marcela
 

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