terça-feira, 26 de abril de 2011

Dinheiro no bolso

Postado por Infinito Particular às 07:58 0 comentários
Ontem perdi 210 reais. E até que estou me saindo bem no processo de recuperação da minha integridade psicológica.

Quer dizer, não estou super feliz. Não achei legal perder 210 reais. Na verdade fiquei arrasada. Mas passado o momento que você acha que ainda vai achar o dinheiro, e vai falar aliviado "nossa, eu ia morrer se eu perdesse", vem o momento em que você se convence que não vai mais achar e aí percebe que não morreu. Ufa!

Afinal, é só dinheiro. Quer dizer, podia ser pior.

Claro que se alguém se comover com a minha situação e quiser me doar anonimamente essa quantia eu vou fica bem feliz, mas se minha fada madrinha não der as caras eu tenho plena certeza que posso superar isso. Mesmo porque a culpa foi minha, eu colocquei o dinheiro no bolso e confiei que o acaso vai me proteger enquanto eu andar distraído.

Só que eu estou sempre distraída, o que foi, aliás, a alegação da minha mãe no momento "críticas construtivas aproveitando a brecha de alguma situação em que você faz uma burrada".

Ficou a reflexão, foi-se o dinheiro. Acho que eu conseguia aprender a lição perdendo apenas 50 reais, mas enfim. Vão-se os anéis, ficam os dedos. Vazios, mas ficam.

A sabedoria popular pode ser bem reconfortante nessas horas.


Postado por: Marcela

domingo, 24 de abril de 2011

A pipoca

Postado por Infinito Particular às 07:36 0 comentários
Rubem Alves (adaptado)

Nunca imaginei que chegaria um dia em que a pipoca iria me fazer sonhar. Pois foi precisamente isso que aconteceu. Lembrei-me do sentido religioso da pipoca. A pipoca tem sentido religioso? Pois tem.
Para os cristãos, religiosos são o pão e o vinho, que simbolizam o corpo e o sangue de Cristo, a mistura de vida e alegria (porque vida, só vida, sem alegria, não é vida...). Pão e vinho devem ser bebidos juntos. Vida e alegria devem existir juntas.

A pipoca é um milho mirrado, subdesenvolvido. Fosse eu agricultor ignorante, e se no meio dos meus milhos graúdos aparecessem aquelas espigas nanicas, eu ficaria bravo e trataria de me livrar delas. Pois o fato é que, sob o ponto de vista de tamanho, os milhos da pipoca não podem competir com os milhos normais. Não sei como isso aconteceu, mas o fato é que houve alguém que teve a ideia de debulhar as espigas e colocá-las numa panela sobre o fogo, esperando que assim os grãos amolecessem e pudessem ser comidos.

Havendo fracassado a experiência com água, tentou a gordura. Repentinamente os grãos começaram a estourar, saltavam da panela com uma enorme barulheira. Mas o extraordinário era o que acontecia com eles: os grãos duros quebra-dentes se transformavam em flores brancas e macias que até as crianças podiam comer. O estouro das pipocas se transformou, então, de uma simples operação culinária, em uma festa, brincadeira, molecagem, para os risos de todos, especialmente as crianças. É muito divertido ver o estouro das pipocas!

A transformação do milho duro em pipoca macia é símbolo da grande transformação porque devem passar os homens para que eles venham a ser o que devem ser. O milho da pipoca não é o que deve ser. Ele deve ser aquilo que acontece depois do estouro. O milho da pipoca somos nós: duros, quebra-dentes, impróprios para comer, mas pelo poder do fogo podemos, repentinamente, nos transformar em outra coisa — voltar a ser crianças! Mas a transformação só acontece pelo poder do fogo.

Milho de pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho de pipoca, para sempre.

Assim acontece com a gente. As grandes transformações acontecem quando passamos pelo fogo. Quem não passa pelo fogo fica do mesmo jeito, a vida inteira. São pessoas de uma mesmice e dureza assombrosa. Só que elas não percebem. Acham que o seu jeito de ser é o melhor jeito de ser.

Mas, de repente, vem o fogo. O fogo é quando a vida nos lança numa situação que nunca imaginamos. Dor. Pode ser fogo de fora: perder um amor, perder um filho, ficar doente, perder um emprego, ficar pobre. Pode ser fogo de dentro. Pânico, medo, ansiedade, depressão — sofrimentos cujas causas ignoramos. Há sempre o recurso aos remédios. Apagar o fogo. Sem fogo o sofrimento diminui. E com isso a possibilidade da grande transformação.

Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro da panela, lá dentro ficando cada vez mais quente, pense que sua hora chegou: vai morrer. De dentro de sua casca dura, fechada em si mesma, ela não pode imaginar destino diferente. Não pode imaginar a transformação que está sendo preparada. A pipoca não imagina aquilo de que ela é capaz. Aí, sem aviso prévio, pelo poder do fogo, a grande transformação acontece: PUF!! — e ela aparece como outra coisa, completamente diferente, que ela mesma nunca havia sonhado.

Na simbologia cristã o milagre do milho de pipoca está representado pela morte e ressurreição de Cristo: a ressurreição é o estouro do milho de pipoca. É preciso deixar de ser de um jeito para ser de outro.


Sei que Rubem Alves tem licença poética para escrever o que bem entender, mas fiquei me perguntando se seria adequado eu me apropriar da sua metáfora e comparar a ressureição de Cristo ao estouro da pipoca. Vendo a minha dúvida mundana, Deus riu para mim, aquele sorriso lindo que ele tem, confirmando que tenho licença para escrever qualquer coisa que eu ache que possa melhorar a vida de alguém. Além disso me lembrei da simplicidade de Jesus; e existe alegria mais simples que a pipoca? Falar de Deus é falar com a paz e a plenitude do simples.


Por isso lhe desejo boa páscoa esperando sinceramente que você veja a beleza de ser como a pipoca. Pensemos na paixão de Cristo. Jesus não poderia ter simplesmente passado para o céu sem dor, sem esforço e sem humilhação? Claro que poderia, e isso não o faria menos santo, e menos herói. Mas mesmo assim ele aceitou o desenrolar dos fatos, e ressuscitou passando com grandeza e humildade pelo caminho mais difícil. E deixou para gente a mais linda história de superação.


Pelo caminho que Jesus percorreu, muita gente virou pipoca. Era um mundo de milhos miúdos, e era difícil perceber que existia algo melhor em cada um deles. Quem acreditaria que eles eram o que se tornaram, e não o que foram a vida inteira? O fato é que o calor do amor de Cristo os levou a serem bem mais do que podiam imaginar. Não foi fácil, é claro. Era o fogo do amor, mas ainda assim queimava. Tudo o que nós leva a mudar assusta. Muitos não quiseram se deixar queimar, porque preferiram pensar que eram a melhor versão deles mesmos. Viraram peruás, e perderam para sempre a oportunidade de tornar a vida de alguém mais alegre.


Os que viraram pipocas foram a festa das crianças. O alimento dos adultos. Uma pausa suave num dia complicado. Estouraram, não sem fogo, não sem ansiedade e dúvida, mas com entrega e fé no calor que transforma.


Jesus é o calor que transforma. Nós somos pipocas em potencial, e há um mundo de medos e angústias esperando ansiosamente pela nossa transformação. Não precisamos sofrer, como Jesus na cruz, para nascermos de novo. Pode acontecer que soframos, mas talvez só seja preciso sentir o calor que emana das mudanças, seja quais forem, boas ou ruins. O fundamental é darmos uma chance para a melhor versão de nós mesmos.


Na páscoa, e em qualquer dia que celebre o amor, lembre-se sempre que o milagre da renovação está em você. Não tenha medo de se tornar uma alegria simples e cheia de significado, como a vida. Como a pipoca.


Feliz Páscoa! :)

Postado por: Marcela
 

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